sexta-feira, maio 05, 2006

MOVIMENTO EM SANTA CATARINA

JOINVILLE ESTÁ NA LUTA POR UM SUL LIVRE DESDE 1992
A maior cidade de Santa Catarina, fundada em 09 de março de 1851, tem em seus limites as sedes de gigantes da economia que garantem força industrial, além de atrair mão-de-obra qualificada de diversos cantos do continente brasílico. Hoje com uma população de cerca de 450 mil habitantes, Joiville foi fundada e tem como principais etnias os alemães, suiços e noroegueses.

A história começou com o casamento que celebrou a união da família imperial brasileira e a realeza francesa. A terra onde hoje está a cidade foi doada ao Príncipe de Joinville, em 1843, como dote da princesa Carolina, irmã do imperador Dom Pedro II. O casal não chegou a conhecer as terras. Parte delas foi negociada com a Sociedade Colonizadora Hamburguesa. Em março de 1851 chegaram os primeiros 118 imigrantes alemães e suíços, seguidos de um grupo de 74 noruegueses. Do ano de fundação até 1897, foram trazidos 28.000 imigrantes germânicos - operários, intelectuais, agricultores e profissionais liberais, que fugiam da Europa em busca de oportunidades no Brasil.

Assim nasceu a Colônia Dona Francisca, que passou a chamar-se Joinville em homenagem ao Príncipe de Joinville. Os imigrantes trouxeram na bagagem o espírito de luta e de trabalho e, embora enfrentando toda sorte de dificuldades, conseguiram transformar uma terra inóspita e selvagem na maior cidade do Estado e num dos mais sólidos parques industriais do País. Desde então, Joinville não parou de atrair gente de todo lugar do mundo - apenas um terço de seus 450.000 habitantes é natural do município. Hoje, Joinville é responsável por quase um quinto de tudo que o Estado exporta. É sede de gigantes da indústria nacional, como Tigre, Brasmotor (Embraco e Cônsul), Döhler e Busscar, entre outros.

É em Joinville que o Movimento O Sul é o Meu País tem uma das suas mais antigas comissões municipais, fundada em 1992, logo no início da instituição. Sob a direção do jornalista Altamir Andrade, aquela comissão também se notabilizou por ser uma das mais ativas comissões do movimento em Santa Catarina. Hoje o movimento possui naquele município uma comunidade que reúne mais de 380 filiados. A comunidade é dirigida pela estudante Soraya Nass.

PLEBISCITO ALTERNATIVO:

A GREVE DE GAROTINHO E O MOVIMENTO O SUL É O MEU PAÍS

Celso Deucher*

O Brazil, através do estado brasileiro (Brasília), é cada dia mais motivo de risos envergonhados entre nós Sul-Brasileiros e aqueles verdadeiros cidadãos brasileiros que tem vergonha na cara. Não fosse pela funesta "sorte" de termos um presidente ideologicamente comprometido com a defesa dos seus companheiros e companheiras de ideologia e não do povo sofrido do seu país, temos ainda que agüentar a vergonha internacional de ver políticos que almejam a presidência do império verde e amarelo, fazer greve de fome.

É de amarelar de vergonha.

Não é por menos que vem crescendo vertiginosamente a multidão dos que se deram conta que o custo é muito caro para ser brasileiro e o benefício, equivale apenas a uma boa dose de masoquismo nacionalista inflado artificialmente. Sem futebol, samba e a fábrica de ilusões que a mídia, serva de Brasília produz, não agüentaríamos mesmo, passar por tanta humilhação.

Enfim, com esta carteira de identidade brasileira, o máximo que conseguiremos no panorama internacional é mesmo, ser o país da prostituição de crianças e adolescentes, crime que culpamos um único responsável: o estado brasileiro. Foi ele quem incentivou a prostituição das nossas mulheres, basta ver os comerciais institucionais bancados por Brasília no exterior nos anos 60, 80 e 90. Mas esse já é um outro papo.

Os cidadãos de bem são ensinados a ver sempre, não só o lado negativo das coisas. Neste caso do Garotinho, quebramos a cabeça para achar alguma coisa que se pudesse analisar como positiva sobre o assunto. Não encontramos. Porém, algo merece ser melhor explicado na “positiva” greve do “nosso” político.

A julgar pelo noticiário sobre o assunto, o que o candidato vislumbra, além de querer seu nome limpo na praça (o que parece será impossível, visto a falta de provas de sua inocência) é resguardar a lisura das eleições de outubro e para tanto, quer que o pleito tenha uma coisa chamada de "acompanhamento de observadores internacionais". Eis pois, a grande novidade nessa greve de "fome política".

Os mais desavisados poderiam se perguntar, o que exatamente isso tem haver com o Movimento O Sul é o Meu País e o que seriam estes tais observadores. Pra que servem afinal essa gente "estrangeira" que Garotinho pede que venham aqui “ficar de olho” em possíveis atos de improbidade nas próximas eleições?

A figura dos observadores internacionais nasceu da conjugação simples de caráter especialmente humanitário, envolvendo a Organização das Nações Unidas, governos nacionais e ONGs internacionais. O papel deles se desenvolve em missões especificas, algumas em situações mais explosivas (como os observadores da ONU na inspeção de armas nucleares do Irã), outras na observação de possíveis danos ao meio ambiente, ao sistema democrático e aos direitos humanos como um todo.

Os observadores cumprem um papel importantíssimo a nível internacional pois são eles, que com uma certa dose de isenção “avalisam” ao mundo se tais ou tais coisas, eventos e processos em um determinado canto do globo são ou não dignas de crédito. Assim como, se não estão de acordo, denunciam possíveis irregularidades. Na maioria dos casos, o papel destes observadores é de zelar para que a Carta das Nações Unidas, as liberdades individuais e coletivas e os direitos humanos universais, não sejam vilipendiados.

Sabedores que somos agora, do papel destes observadores, resta-nos explicar no que eles podem nos ajudar, na luta pelo direito de autodeterminação do Povo Sul-Brasileiro, defendida pelo Movimento O Sul é o Meu País.

Não é novidade para ninguém que Brasília, dificilmente nos cederá o direito de provarmos ao país e ao mundo que aqui na região Sul do continente existe um povo, sujeito de direitos, que não mais se identifica com aquele país e que por este motivo e vários outros, luta para ver reconhecido seu direito universal e inalienável de mudar de identidade e ter o seu próprio Estado Nacional, organizado como melhor lhe convier. Este povo quer ver reconhecido na prática o que reza com todas as letras as resoluções da ONU, os pactos internacionais de direitos civis, políticos, culturais, econômicos e sociais, além da Declaração Universal dos Povos e a Declaração Universal de Direito dos Povos: "Todos os povos têm o direito à livre determinação; em virtude deste direito, determinam livremente o seu estatuto político e orientam livremente o seu desenvolvimento econômico, social e cultural".

Está no projeto de ação do Movimento O Sul é o Meu País, após terminada a fase de organização e representação em todos os municípios Sulistas e depois de discutir com o povo Sul-Brasileiro um projeto democrático de país, levar a cabo, por sua própria conta, o que convencionamos chamar de "Plebiscito Alternativo".

Para que, este ato do movimento tenha a idoneidade e seja realmente reconhecido pela comunidade internacional, a entidade pretende convidar, pelo menos cinco entidades internacionais de direitos humanos para que venham ser observadoras de todo o processo. Eles poderão atestar no panorama internacional, com a dose de isenção necessária aos processos democráticos, se o povo Sulista quer ou não a sua autodeterminação. Se este Plebiscito é ou não digno de crédito pelos organismos internacionais.

Torcemos para que a resposta do Povo Sulista seja um retumbante Sim. De posse do resultado deste verdadeiro processo democrático, será então, definitivamente despoletado o processo seguinte da revolução pacifica, que não temos dúvida, levará o Sul a total autodeterminação ante ao imperialismo de Brasília.

Quem sabe essa resposta já esteja nas urnas em 2008?

*Presidente do Movimento O Sul é o Meu País, Secretário Geral do Gesul - Grupo de Estudos Sul Livre

OPINIÃO DO GOVERNADOR:

Colônias, províncias ou estados?

Germano Rigotto*

Existem, basicamente, duas formas de se organizar um estado nacional. A forma unitária e a forma federal. No primeiro caso, o poder político é centralizado e toda a gestão pública se faz sob a condução de um governo central. Na forma federal, há uma repartição do poder entre os Estados-Membros. O Brasil nos fornece um bom exemplo das duas situações. Do Governo-Geral de Tomé de Souza até a Proclamação da República, o Brasil foi gerido em forma de estado unitário, subdividido em províncias. A partir da Proclamação, adotou a forma federal.

Se os primeiros tempos da vida republicana poderiam justificar um certo desequilíbrio nessa repartição do poder, com tendências hegemônicas do poder central, decorrido mais de um século é descabido que isso ainda persista. Nas primeiras décadas do século passado vivíamos uma fase de transformação de hábitos políticos. Agora, não há razão para que a União trate os Estados e Municípios como tutora, ou - o que certamente é ainda pior - como as antigas metrópoles se relacionavam com suas colônias.

Não há sentido político, nem pode ser eticamente aceitável que a União se aproprie de dois terços de tudo o que é arrecadado pelo setor público brasileiro. E tampouco é admissível que, apesar disso, ainda escamoteie aos Estados o que lhes é devido por força da Lei Kandir. A União deveria estar ressarcindo anualmente, aos Estados e Municípios, em quase 20 bilhões de reais.

Vimos sistematicamente pleiteando a metade desse valor. Nos é concedida a metade da metade. E nem isso é pago na integralidade. Do que ficou acertado para o exercício fiscal de 2005 ainda não foram creditados aos Estados exportadores 900 milhões, parcela que vimos insistentemente buscando. E o orçamento da União para 2006 vai ter que ser corrigido com o objetivo de incluir as indenizações da Lei Kandir que, mais uma vez, não estavam previstas.

Quando começamos a enfrentar esse tema com o governo federal, muitos pensaram que se tratava de uma questão local, de uma questiúncula gaúcha. Agora ficou evidente que todos os Estados exportadores estão sendo vitimados pela insensibilidade do governo da União. Esta incompreensão tem levado as empresas que exportam a acumularem créditos junto aos Estados, sendo que o Rio Grande do Sul é o Estado que mais tem pago créditos aos seus exportadores.

Mas não podemos continuar com uma Federação cuja conduta fiscal compromete a democracia, a autonomia dos Estados, as reivindicações da sociedade e o bem comum do povo brasileiro. Não somos colônia, não somos província e não admitimos ser tratados como tal.

*Governador do Rio Grande do Sul. Artigo publicado no Especial, Jornal NH, de 01 de novembro 2005

MOVIMENTO NO RIO GRANDE DO SUL:

São Borja na luta por um Sul Livre
O município é nacionalmente conhecido, por que lá está enterrado o ex-presidente Getúlio Vargas. O mesmo que queimou as bandeiras do Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul em nome da chamada "unidade nacional", fazendo sua própria filha, mais tarde, confessar de público que "chorou" ao ver o pavilhão da República Riograndense ser tomado pelo fogo. Não há dúvidas de que o ex-presidente fez muitas coisas positivas pelo país, porém, na questão do respeito as identidades regionais, foi um dos que mais perseguiu e negligenciou o sentimento dos povos. Talvez, como denunciam, pela sua intima ligação ao nazi-fascismo no começo da 2ª guerra.
É na terra natal de Vargas, que reside o nosso entrevistado de hoje, o companheiro de luta Vasco Ceretta. "Nasci e morro em São Borja há 37 anos e lembro quando era criança, dos meus avós, que já não existem mais, que o Rio Grande deveria ter uma porteira, e dele só poderia sair e vir a turismo, pois nós sozinhos teriamos uma vida melhor, se não dependessemos do Brasil. Muitas vezes ouvi eles tomando chimarão em um galpão, debaterem a questão separatista. Eles achavam que o Getúlio deveria ter vindo para cá e feito do Rio Grande um país" conta Ceretta. Alias, diz ele, "Getúlio nada fez por essa terra, o que aqui tem é fruto de pessoas anônimas que se engajaram em lutas para conseguir".
Por conta disso, conta Vasco, viu muitas pessoas empobrecerem no Rio Grande por conta de planos econômicos lançados por Brasília. "Estou vendo pessoas na miséria por que a economia nacional não está voltada para o desenvolvimento humano, ela tem outros fins", diz ele. "Acho que o povo brasileiro está de certa forma hipnotizado por algum poder oculto, pois não é possivel que com tanto escandalo não tenha havido, uma só manifestação popular contraria a isto, avalia. E pergunta: que sentimento é esse? Será que é o patriotismo brasileiro?
Quando se refere a questão da autodeterminação do povo Sul-Brasileiro, Ceretta confessa que já fala sobre o assunto desde 1987. Conta ele que certa vez quando eu estava estudando, conseguiu uma camiseta do Movimento Republica do Pampa e ao tentar entrar na sala de aula, foi trancado do lado de fora por um professor de matemática que era partidario do PDS na época. "Debatiamos na aula o Separatismo e ele ficava uma féra", diz.
"Se não fossemos tão coniventes com o tratamento que recebemos do estado brasileiro, já estariamos separados, pois por muito menos que isso a Revolução Farroupilha teve inicio", analisa. Na sua visão, hoje os bancos lesão o cidadão, o governo lesa a agricultura que é a economia da sua região. "Aqui se não tem soja, arroz, gado, o comercio fecha, as pessoas se matam, bebem até morrer, a vida de todos aqui está difissilima", diz. Separatista convicto, Vasco teme pelo futuro da Tradição Gaúcha. "Sou gaucho mas não vou em piquete de 20 de setembro. Uma vez discuti com um cara de um CTG, que colocou a bandeira do Rio Grande atrás de uma porta e a do Brasil na entrada. Veja a ignorancia, a burrice de um ato deste para com nosso pavilhão. Depois deste dia numca mais fui em CTG, pois entendo que não é por ai que vamos realmente valorizar as nossas tradições, nossos usos e costumes", explica.
Ele acredita que o mundo está passando por uma mudança radical, que está afetando a todos. "O inconformismo é geral, mudanças grandes irão acontecer num futuro muito próximo e os acontecimentos apontam para isso". Precisamos nos unir para lutar pelo nosso Sul". Ao falar do por que apóia o movimento O Sul é o Meu País, Vasco Ceretta diz que acredita na organização e nas propostas sérias, estudadas com fundamento para discussão. "É algo que não havia encontrado antes. Já tinha visto outros grupos, mas eram fechados demais e sem ideaís, sem postura. Tudo muito no ar".
Perguntado, como encontrou o Movimento, ele explica que encontrou na Internet quando pesquisava sobre separatismo no Brasil e a respeito de direito de Autodeterminação dos Povos. "Eu já conhecia e havia estudado este tema, mas não conseguia encaixar nele o nosso tipo de separatismo. Reli varias vezes matérias sobre este assunto e já estava acreditando que somente com uma luta armada para chegar a tal feito. Mas agora lendo os principios e as propostas do Movimento O Sul é o Meu País mudei de idéia e começo a acreditar ser possível, bem mais possível que antes", finalisa Vasco Caretta.

O SUL E O QUEBÉC

TESE DE MESTRADO TRATA DA QUESTÃO SULISTA E DO QUEBÉC

Em 2003, o então universitário Warley Pereira Pires, graduando-se na Universidade Federal de Minas Gerais desenvolveu a sua monografia baseada na geografia politica mundial, sob o título, "Do Canadá ao Brasil: por uma geografia da alteridade". Agora, em 2006, esta monografia se desdobra e serve de texto base numa dissertação de mestrado na Universidade Federal Fluminense (UFF). Abaixo publicamos a monografia base, por que acreditamos, salvo alguns erros de interpretação e maior conhecimento da realidade da luta Sulista, que este texto possa trazer alguns elementos necessários a nossa compreensão espacial da questão. Apesar de grande o texto, vale a pena a leitura.

Do Canadá ao Brasil: por uma geografia da alteridade

Warley Pereira Pires*

O quadro político mundial, expressão do sistema interestatal é um dos objetos das investigações da geografia política. Ele deve ser interpretado e analisado face as dinâmicas espaciais resultantes de processos internos e externos que mudaram drasticamente no passado e que, sem dúvida, experimentarão alterações importantes no futuro (TAYLOR 1993).
Ao longo da história da humanidade diversas manifestações separatistas são assinaladas com sucesso ou menor êxito. Para ilustrá-las, lembramos o processo de emancipação de Estados europeus, a emancipação de colônias das Américas, os processos de descolonizações Afro-asiático assim como, os processos de desmembramento dos antigos países comunistas, a partir da queda do Muro de Berlim. Todos eles com distintos protagonistas cujos interesses apontavam dinâmicas nem sempre de clara leitura em termos dos arranjos espaciais. Em virtude desse conjunto e seus resultados, cabe à geografia pensar e repensar o espaço em vários momentos da história.
A emergência de movimentos separatistas no mundo ganhou força, sobretudo após a Segunda Guerra Mundial, desencadeando a independência de muitos países da África e da Ásia. No final do século XX, eles adquiriram novas formas, passando a proliferarem em diversas regiões resgatando, criando ou reforçando identidades nacionais, regionais ou até mesmo locais.
Muitos estudiosos creditam a esses movimentos uma reação à globalização da economia que também acentua as particularidades territoriais. A globalização conduzida pelos grandes bancos e corporações transnacionais retira o poder do Estado sobre o processo produtivo e afeta sua integridade territorial nacional e sua autonomia. Os movimentos nacionalistas de cunho separatista, bem como movimentos sociais apoiados na afirmação da identidade e na tradição do lugar eclodem (BECKER 1995). Esses processos podem ser exemplificados pelas manifestações separatistas no Canadá, Itália, Espanha e Brasil (ANDRADE 1998; VERDERY 1996). A soberania é afetada tanto em sua face externa, ao ser questionada pelo poder econômico e financeiro, quanto em sua face interna. Ela apresentará uma tendência atomizante, produzida por enclaves econômicos e territorialidades políticas, diretamente articulados ao espaço transnacional, contribuindo enquanto agentes destruidores das forças centrípetas que mantém a união dos Estados (BECKER 1995).
Muitos desses movimentos reivindicam dos governos federais uma maior autonomia no interior da federação ou confederação. Eles almejam uma melhor distribuição dos recursos fiscais repassados pela União. Por vezes os recursos se apresentam mais concentrados numa determinada região, normalmente a mais rica, ou aglutinados na esfera da capital federal, prejudicando os interesses das demais províncias, estados ou regiões (MARTINS 1997; ANDRADE 1998).
A importância das manifestações e dos movimentos separatistas decorre da discussão a propósito das funções do Estado (hoje cada vez mais perante a globalização), mas também da necessidade de se identificarem as forças centrípetas e centrífugas que advogam pela separação ou manutenção da união das regiões seccionistas (MARTINS 1997). Este conjunto de fatores interfere na autonomia e na distribuição dos recursos pelo Poder Central e a qual substrato ideológico se justifica a criação de novos Estados-Nações.
Entre as inúmeras manifestações separatistas destacam-se as do Brasil e Canadá. Estes países apresentam algumas semelhanças que podem justificá-las como, por exemplo: uma vasta extensão territorial, 8.547.403 km2 para o primeiro e para o segundo 9.970.610 km2, as diversidades culturais representadas pelo regionalismo que conferem caráter único, a cada uma das grandes regiões ou estados (o nordestino, o gaúcho, o mineiro, o amazônico, entre outros).
Ambos países constituem-se em federações[1], cujas unidades federadas possuem relativa autonomia administrativa e política. Os administradores das províncias ou estados são eleitos pelo povo e têm (muitas vezes) autonomia para criarem leis válidas para o seu território, desde que não contrariem as leis federais.
Apesar destas características, existem comunidades regionalizadas que manifestaram em distintos momentos de sua história, o desejo de separação do restante da nação: na região do Sul do Brasil e a província do Quebec (Canadá). Ambas regiões, guardadas as proporções, têm em comum bons indicadores sócio-econômicos, peso econômico significativo em suas economias nacionais, colonizações diferenciadas e uma língua distinta (no caso do Quebec).
No caso brasileiro, as diferenças culturais (que remetem aos conceitos de comunidade e pertencimento) reforçam as particularidades e podem significar a sobrevivência de comunidades ou regiões (pelo menos nos discursos dos seccionistas). Outros fatores que alimentaram em alguns estados, o surgimento de tais manifestações foram: as diferenças econômicas, a guerra fiscal e tributária entre as unidades federativas, o repasse do fundo de participação dos municípios e o ICMS, a criação de emprego, a promoção e o desenvolvimento, o reequilíbrio de mercado, a emergência de regiões ou comunidades no conjunto da cena nacional negligenciadas, em alguns períodos da história como no século XIX e no final do século XX.
Ao longo da história salienta-se a Revolução Farroupilha que eclodiu no Rio Grande do Sul de 1835-1845. Os presidentes que governavam o Rio Grande do Sul normalmente oriundos de outras províncias desconheciam os anseios da população, bem como a província que iriam governar (ANDRADE 1998). Registra-se também a insatisfação dos estancieiros gaúchos em relação à centralização maciça imposta pelo governo federal. Um sentimento de exploração econômica sofrida pela província fortifica seu desejo de separação do pelo resto do Brasil (OLIVEN, 1993).
A explosão desse movimento é tida como reflexo nas elites locais das idéias liberais da França, a emancipação dos Estados Unidos e das colônias espanholas na América que adotaram regime republicano. Desta forma, foi proclamada a República Rio-Grandense, também conhecida como República Piratini em 1836, na cidade de Piratini (RS). A revolução repercutiu em Santa Catarina, com a proclamação da República Juliana, em 1837. O governo imperial só sufocou a revolta em 1845. Mesmo com o fim do movimento, permanece o forte sentimento regionalista no Rio Grande do Sul (ANDRADE 1998; PESAVENTO 1993).
A criação do Estado do Iguaçu em 1943 por Getúlio Vargas abrangia terras do oeste de Santa Catarina e sudoeste do Paraná. Ele foi extinto em 1946. A proposta de sua retomada voltou a tramitar no Congresso Nacional na década de 80 (MARTINS 1997). Assim, a ideologia separatista no Brasil, “embora apresentada com certo cuidado, é mais acentuada em certas áreas, como na região meridional" (ANDRADE 1998).
A região Sul do Brasil é composta pelos estados do Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul, segundo a regionalização do IBGE de 1970 (IBGE 1996: I-43). Desde a década de 80 do século XX, um sentimento separatista tem sido observado através da organização de grupos como o Movimento de Independência do Pampa Gaúcho, liderado por Irton Marx (organizado em Santa Cruz do Sul, Novo Hamburgo e São Leopoldo); o Movimento o Sul é o Meu País (Curitiba); o Partido Republicano Farroupilha (Porto Alegre);e, a Frente de Autodeterminação do Sul (Santa Maria) todos de caráter seccionista. A título de exemplo, no caso Movimento de Independência do Pampa, a imprensa ao invés de organizar um debate esclarecedor, preferiu a exploração de matérias sensacionalistas em torno da figura caricata de Irton Marx. Efetivamente, se reduzirmos as propostas dos grupos separatistas gaúchos ao MIP e de seu líder, poderia parecer que o separatismo manifestaria traços arcaicos do regionalismo gaúcho. (ALBUQUERQUE 1998). A idéia separatista se apresenta mais forte nas regiões onde predominam descendentes de imigrantes alemães e italianos (ANDRADE 1998).
Já no Canadá, enquanto um movimento mais concreto, de repercussão e apoio mais amplos, prioriza-se a província francófona do Quebec, que reivindica por razões culturais, lingüísticas e até mesmo históricas sua separação do resto do país (BÉLANGER et al. 1999). O separatismo do Quebec toma "maior força e visibilidade internacional", na década de 80, quando um referendo propondo a separação foi rejeitado. Outro em 1995, por 1% de diferença, mais uma vez não se obteve a vitória.

Manifestações do Sul do Brasil e do Quebec: Semelhanças e Diferenças

As observações separatistas do Sul do Brasil e do Quebec podem ser consideradas como nacionalismos de separação classificados por ORRIDGE (1981 em TAYLOR 1993). Elas iniciaram-se em fins do século XIX e sofreram os efeitos da globalização, nas últimas décadas do século XX. Elas combinam elementos étnicos, lingüísticos e culturais na busca de identidades regionais cujas questões econômicas podem ser associadas aos momentos de graves crises agudas.
As manifestações nacionalistas de separação, na região Sul do Brasil e no Quebec conservam diferenças em seus processos e dinâmicas, portanto não se trata aqui de uma análise comparativa. Diferentemente do Sul brasileiro, o Quebec constitui aquilo que pode ser chamado de “nação”. A província do Quebec possui unidade cultural: língua (mantém a língua oficial francesa), cultura e etnia diferentes do resto do Canadá, de ascendência inglesa. Já o Sul brasileiro, sem uma língua própria, fala-se também o português, apresenta em certas comunidades a presença de outros idiomas. Para exemplificar esta colocação, em Blumenau a empresa Hering durante muitos anos exigiu que os funcionários fossem bilíngües.
As organizações políticas são bem díspares. O Sul não possui partidos regionais ou nacionais oficiais que defendam especificamente os interesses da região. As organizações separatistas regionais: o Movimento para a Independência do Pampa Gaúcho, o Movimento O Sul é meu País e o Partido Republicano Farroupilha não são oficiais. Já no Quebec ressaltam-se os partidos oficiais: o Bloc Québécois (nacional) e o Partido Québécois (provincial), ambos declaram um caráter nacionalista-separatista. Quanto à organização das eleições, ela também é diferenciada. No Sul, assim como em todo Brasil, todos os cargos políticos são eleitos por sufrágio universal (sistema presidencialista). No Quebec, à exceção dos deputados, os demais cargos são eleitos por indicação (sistema parlamentarista).
A tensão face às medidas adotadas pelo governo central por causa de aspectos políticos, econômicas, sociais e culturais se apresenta mais latente entre o Quebec/Canadá do que entre a região Sul/Brasil. No Brasil prevalecem os interesses dos partidos e no Quebec dominam os interesses da província.
No que se refere as consultas populares, o Quebec encontra-se bem a frente da região Sul. Já foram realizados dois referendos (1980 e 1995) para decidirem a respeito da separação. Na região Sul do Brasil não se conseguiu nem mesmo realizar um plebiscito. Uma baixa mobilização separatista lançada pela República dos Pampas (1993) não indica que seja organizado um plebiscito.
As eclosões dos nacionalismos mostram-se desiguais conforme o contexto histórico e os elementos que envolvem, como o reconhecimento desta vontade por parte de suas sociedades. Na região Sul, foram mais latentes na primeira metade do século XIX e a partir da década de 80 ou 90 do século XX. Na província do Quebec, as manifestações sobressaem-se sobretudo a partir da década de 60 do século XX.
As observações deste estudo quanto às manifestações nacionalistas- separatistas para a região Sul do Brasil e a província do Quebec salientam algumas semelhanças. Ambas regiões conheceram diferenças de colonização: o Sul foi colonizado por maior número de alemães, italianos, eslavos, açorianos, espanhóis e portugueses, do que o restante do Brasil (ANDRADE 1998). Já a província do Quebec foi colonizada pela França (salvo algumas áreas incorporadas à província, de colonização inglesa) (MORTON 1989). Em ambas as regiões são conferidas sentimentos de identidade diferenciados do Brasil ou do Canadá.
Ambas as regiões sentem-se espoliadas pelo governo central. O Sul do Brasil se coloca explorado pela cobrança de tributos, pelo repasse de recursos fiscais e pela política da capital, Brasília. O Quebec reclama da política de eqüidade das províncias canadenses dirigida por Ottawa, da redução das diferenças entre anglófonos e francófonos, assim como da tentativa de dissolver o Estado de Bem-estar Social.
A afirmação das identidades regionais no contexto da economia globalizada são expressas, no Sul, a sulina ou gaúcha e em Quebec, a franco-quebequense. Elas constituem-se reação regional ao processo de globalização que traz entre outras conseqüências, a massificação de hábitos, costumes e modos de vida.As manifestações foram consideradas como perigosas para alguns opositores em relação ao seu poder de conduzir à desestruturação política, ou seja, o fim das unidades territoriais do Canadá e do Brasil. Ressalvadas a maior intensidade, a organização e as ações do movimento no Quebec, lá ele é apresentado como de maior perigo.
Apesar de fazerem parte de federações, o Quebec e os estados da região Sul do Brasil, reclamam maior autonomia cultural, econômica, política, e social. Nestas colocações se encontrariam o direito de separação. O Canadá, um país a ponto de desintegrar-se, presencia-se atualmente a ausência de uma vontade política para verdadeiras negociações como o governo do Quebec, visando estabelecer uma associação eqüitativa e respeitosa das nações que vivem num território comum. A Constituição de 1982, os Acordos do Lago Meech, de Charlottetown e Calgary são meios jurídicos que impedem o direito do Quebec à autodeterminação, o nível de apoio à causa separatista, o porquê da separação, os custos, e o desmantelamento territorial da província caso queira separa-se (GAGNON 1998).
O acirramento do movimento separatista do Quebec intensificou-se a partir da década de 70, quando o governo central canadense começou a repensar seu papel e tamanho social. Contribuíram ainda o déficit econômico decorrente da dívida interna e externa ampliada pelos desequilíbrios orçamentários. Os anos 90 aprofundaram a recessão, embora tenha sido implementado o Acordo de Livre Comércio da América do Norte - NAFTA (BÉLANGER et al. 1999).
Os movimentos nacionalistas, a partir das últimas décadas do século XX, caracterizam-se por um enraizamento num racionalismo econômico, ou seja, numa estreita lógica contábil de custos/ benefícios, a autodeterminação mercantil. Ela busca livrar-se do colonialismo interno dos Estados nacionais. Assim, para alguns estudiosos, essas regiões (no caso o Sul do Brasil e o Quebec) reclamam uma maturidade econômica e política para a secessão (LÉTOURNEAU 1999).
A crise econômica dos anos 80 e a recessão dos anos 90 fortaleceram as manifestações: no Sul levando a proclamação da República do Pampa Gaúcho (unilateral e não-reconhecida), uma maior organização do Grupo de Estudos do Sul Livre (ALBUQUERQUE 1998), a emergência do Estado do Iguaçu, na Assembléia Constituinte 1988 e no Congresso Nacional em 1991 (MARTINS 1997), e em Quebec os dois referendos. Devem ser realçadas a mobilização da sociedade civil e a maior abertura política especialmente com os avanços democráticos para se fazerem transparentes e públicos (apesar das regiões em estudo terem tido trajetórias políticas e mobilizações diferentes).
As tensões regionais no Canadá não referem-se apenas ao Quebec, ocorrem também nas províncias do Oeste que acusam o governo de Ottawa de favorecer o Canadá central. Esses descontentamentos demonstram que a união do Canadá não foi bem feita. E por fim, os resultados do plebiscito de 1995 em Quebec não significaram o fim da campanha separatista, mas um adiamento da marcha em direção à autodeterminação (LÉTOURNEAU 1999).

Considerações Finais
O presente estudo constatou-se que as manifestações separatistas da região Sul do Brasil e da província do Quebec ocorreram com maior intensidade em períodos diferenciados. A região Sul brasileira a partir de 40 e 90 e o Quebec desde a década de 60 do século XX, ressalvadas a maior mobilização e organização das manifestações. Observou-se um enfraquecimento nas manifestações sulistas a partir da proclamação da República do Pampa em 1993 (talvez por seu caráter de espetáculo). Já o Quebec, após os plebiscitos de 1980 e 1995, continua seu embate político com o governo canadense na busca pela separação, ressalvados os entraves por este colocados.
As manifestações investigadas também resultam do processo de globalização/fragmentação que incentivam a busca e afirmação das identidades entre o “Nós e os Outros” sobretudo após a segunda metade do século XX. Assim, as manifestações observadas no Sul do Brasil incipientes constituem-se em anseios embrionários ou ocultos se pensados face ao Quebec no tocante à mobilização e organização política (Partido Quebecóis, Bloco Quebecóis e União Nacional), bem como do reconhecimento de direitos.

[1] O federalismo, na definição de ALMEIDA (2000, p.89), “é um sistema baseado na distribuição territorial - constitucionalmente definida e assegurada - de poder e autoridade entre instâncias de governo, de tal forma que os governos nacionais e subnacionais são independentes em sua esfera própria de ação”. As formas federativas contemporâneas utilizam o termo descentralização para indicar graus de redução do escopo do governo federal, em decorrência do deslocamento do poder de decisão e da competência para implementar e gerir políticas para instâncias estaduais e ou municipais e da passagem de atribuições da área governamental para a sociedade civil, traduzidas no fortalecimento das relações intergovernamentais. (ALMEIDA 2000).

Referências Bibliográficas:
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